O projeto Porto-Valongo ganhou novo capítulo no final do mês passado, com a apresentação dos detalhes do trabalho de revitalização que será realizado na área que abrange os armazéns 1 a 8 do Porto. A principal novidade em relação a mostras anteriores foi o anúncio de que serão erguidos dois prédios – um hotel e um empreendimento de cunho empresarial – em uma área que será construída sobre a superfície de água, com o objetivo de que tais torres sejam atrativos para viabilização econômica do projeto. Estão previstos cerca de R$ 544 milhões em investimentos da iniciativa privada para que os trabalhos iniciem já no próximo ano.<
Projeto – Nova marina no Porto Santos
Para se chegar a um “denominador comum” do que seria necessário em termos de revitalização no Porto de Santos, contudo, tanto Cidade como a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) tiveram de ir atrás de exemplos nacionais e – principalmente – internacionais que, de alguma forma, pudessem indicar caminhos para o projeto a ser desenvolvido nos armazéns santistas. Alguns desses exemplos foram apresentados no Seminário Internacional Revitalização de Áreas Portuárias e Integração Urbana, realizado no último mês. Casos dos trabalhos realizados nos portos de Marselha, na França, e Belém, no Estado do Pará.
A revitalização do Porto de Marselha é considerada uma das mais próximas daquela que se pretende verificar por aqui. “Santos e Marselha têm muitas coisas em comum. São duas cidades não-capitais importantes para seus países. Além disso, Santos tem o maior porto da América Latina, e Marselha, o maior do Mediterrâneo. Sem contar que, assim como em Santos, Marselha sofria muito com o distanciamento cidade-porto em 1995, quando foi lançado o projeto de revitalização”, conta Chantal Guillet, diretora geral da Adéfrance (Aménageurs et Dévellopeurs em France – consórcio responsável pelos trabalhos no município francês).
Segunda maior cidade da França e com mais de 2.600 anos de existência, Marselha sofria com índices elevados de pobreza, insegurança e uma queda cada vez mais acentuada da população, que buscava outros destinos atrás de uma vida melhor. No começo dos anos 90, o desemprego batia nos 20%. Além disso, como o trânsito de contêineres ocorria predominantemente a 70 quilômetros de se encontra a região portuária marselhesa (ainda que na mesma orla), o local – que já foi chamado de porto dos gregos, devido à origem dos fundadores da cidade – estava fadado ao abandono.
Então, em 1995, surgiu o projeto Euroméditerranée, coordenado pela Adéfrance. De acordo com Chantal, o objetivo era fazer da área portuária um novo bairro, em interface com a cidade. “O mais importante para nós era receber todo tipo de população, mas, sobretudo, manter em Marselha a população local. Outro mote era atrair empresas que pudessem gerar empregos e mudar nossa imagem, retomando o status de “porta” da Europa para o Mar Mediterrâneo”, conta. Segundo ela, o programa foi composto de duas fases. A primeira delas foi até 2011, e ao longo de 16 anos, atingiu números significativos.
“Na primeira fase, ademais de empresas de equipamentos culturais, o número de habitações cresceu em 10 mil, e outras seis mil foram renovadas, além de 15 mil empregos novos, tudo em uma área com cerca de 1,5 milhão de metros quadrados de construção. Foram criados 20 hectares (200 mil metros quadrados) de espaços públicos, com algo em torno de 3,5 bilhões de euros de investimentos, sempre privados”, enumerou. A segunda fase, iniciada neste ano e prevista para até 2020, pretende dobrar esses números.

Mas a revitalização de áreas portuárias não se limita ao exterior. No Brasil, um dos principais exemplos é a Estação das Docas, em Belém. O projeto – que comemora 12 anos neste domingo (13) – é um complexo turístico e cultural que reúne gastronomia, cultura, lojas, exposições e eventos nos cerca de 32 mil metros quadrados que ocupam três armazéns outrora subutilizados e um terminal de passageiros. “A Estação das Docas foi concebida para fomentar o turismo e proporcionar atrações diferentes de lazer, e já se tornou o principal ponto turístico para quem vai ao Pará”, destaca o arquiteto Gustavo Leão, diretor do Departamento de Projetos da Secretaria de Estado da Cultura do Pará.
Situado em um rio, o Porto de Belém fica próximo a um canal que constantemente assoreia o solo da região, obrigando a realização de constantes dragagens no terreno. Além disso, o calado de aproximadamente nove metros, considerado baixo, impede que navios de grande porte atraquem no porto da capital paraense. “Do ponto de vista dos equipamentos, temos um Porto moderno. Mas a área de cais é a mesma de décadas atrás. Isso fez com que o Porto entrasse em declínio. Tanto que os três armazéns usados hoje pela Estação das Docas não vinham sendo usados pela CDP (Companhia Docas do Pará). Até porque esse trecho não servia para receber embarcações”, explica Leão.
As obras para construção do equipamento que pretendia revitalizar aquela área se iniciaram em 1997, e foram orçadas em cerca de R$ 19 milhões, por meio de investimentos públicos. A CDP concedeu os armazéns por um prazo pré-estabelecido e, para coordenar o empreendimento, foi criada uma organização social sem fins lucrativos de nome Pará 2000, da qual a Secretaria de Estado da Cultura faz parte do conselho fiscal. As únicas licitações realizadas para o projeto Estação das Docas foram mesmo para concessão dos espaços para estabelecimentos comerciais e gastronômicos.<
Para Leão, uma semelhança identificada no Porto-Valongo em relação ao projeto paraense diz respeito à revitalização não se limitar ao espaço portuário. “Vejo que no trabalho de vocês (Santos) há toda uma área do Centro Histórico que será recuperada, além do fortalecimento turístico com a vinda, por exemplo, do Museu Pelé. Em Belém, bem ao lado da Estação das Docas fica o Complexo do Ver-o-Peso, que é uma das maiores feiras livres da América Latina, com ervas e temperos típicos da região amazônica. Nesse caso, a Estação das Docas pôde complementar, por seu potencial gastronômico”, conclui.
Jornal da Orla