Teatro Guarany, em Santos, completa 130 anos de inauguração

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Há 130 anos o Teatro Guarany foi inaugurado em Santos, no litoral de São Paulo. O local foi o primeiro prédio da cidade construído para ser teatro.O município tinha um teatro adaptado, que funcionava em um armazém onde atualmente é a Praça Mauá, e que começou a funcionar na cidade por volta de 1830, mas que não atendia mais os novos hábitos da população da cidade.

Segundo Taís Curi, jornalista e pesquisadora, a partir da inauguração do Teatro Guarany Santos entrou na rota cênica mundial, ao lado de Rio de janeiro, Buenos Aires e outros municípios da época. “Recebíamos espetáculos internacionais, artistas de renome”, conta Taís. A pesquisadora explica que o nome Guarary surgiu em função do romance de José de Alencar e a peça de Carlos Gomes.

A primeira grande reforma do Guarany aconteceu em 1910, quando a Santa Casa de Misericórdia comprou o teatro de um grupo de comerciantes de café. Taís passou quatro anos pesquisando sobre o teatro e escreveu um livro, onde reúne também fotos da época. “O Teatro Guarany teve seu auge até mais ou menos à década de 1920. Depois, com o surgimento do Teatro Coliseu, e também com o início do deslocamento de parte da população para a orla da praia, houve um esvaziamento e as pessoas que ficaram no Centro tinham um poder aquisitivo menor, isso acabou prejudicando também a audiência do teatro, e ele foi entrando em um lento processo de declínio”, diz a pesquisadora.

A história do Teatro Guarany quase teve fim em 1981, quando um grande incêndio destruiu quase toda a construção. Pouco depois do incêndio, um grupo de arquitetos recém-formados realizou uma semana para discutir o futuro do teatro. O arquiteto Ney Caldatto era um dos membros do grupo. “Era um grupo coordenado pelo meu irmão, que propôs na época sensibilizar as autoridades para promover uma futura restauração do Teatro Guarany, que na época corria o risco de demolição”, explica Ney.

Com o tombamento do prédio pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Santos (Condepasa), como patrimônio cultural, e mais tarde, com a venda do prédio para um comerciante da cidade, o Ministério Público entrou praticamente obrigando o proprietário a restaurar o bem tombado. “Só que começa aí uma série de impasses, já que o proprietário não tinha condições financeiras de arcar com essa obra, gerando mais deterioração do imóvel”, conta o arquiteto.

Durante mais de 20 anos o prédio ficou abandonado, até que Prefeitura comprou o teatro, começando uma reforma que levou dois anos para chegar ao fim. Em 2008 a reforma foi concluída. “Foi uma restauração desafiadora, não foi uma obra simples. O projeto recupera tudo que era de original e que o prédio se mostrava. Técnica construtiva, ornamentação, cores. Nós fizemos uma intervenção, que revela um pouco de sincretismo entre o novo e o antigo, porque o novo se adapta, ele vem e se molda dentro do espaço que o teatro oferecia para a gente. Esse foi o grande desafio e a surpresa ao vê-lo pronto”, diz o arquiteto.

Algumas obras foram perdidas no incêndio e mesmo com os esforços dos restauradores, as obras de Benedicto Calixto que estavam nas paredes e no teto, não puderam ser recuperadas. O artista plástico Paulo Von Poser foi contratado pela Prefeitura para pintar o maior espaço do prédio, o teto. Foram cinco meses de trabalho que fizeram, inclusive, o artista morar no teatro. “Para poder me adaptar um pouco a dinâmica da obra, e encaixar os horários, era também um trabalho muito concentrado, e viver um pouco o teatro. Quando eu entrei aqui a primeira vez a obra já estava acontecendo, quer dizer, quando eu vim não tinha nem teto para conhecer, mas viver aqui, ter contato com a própria dinâmica, foi uma experiência que me ajudou na própria concepção e na intensidade do trabalho”, lembra o artista plástico.

A escolha do desenho foi inspirada em cenas da ópera ‘O Guarany’. “A primeira cena é uma luta guarani, é uma índia morta, que é o motivo de toda essa desavença, e também é uma homenagem a esse povo que sofre. Depois você têm os personagens principais, Ceci e Peri, e aí acontece toda a história circundando, como uma alegoria, e lá em cima é o encontro desse amor, um amor tão incrível entre um índio, um super-herói e uma adolescente portuguesa”, conta o autor da pintura. A obra foi toda desenhada sobre tela de algodão, trabalhada em partes, como em um quebra-cabeça. “Ele foi todo feito a grafite, carvão e a cor entra quase como uma cor sobre o desenho com um giz caran d’ache”, explica Paulo.

Roberto Peres, diretor da escola de Artes Cênicas do Guarany, acredita que a cultura do teatro constrói o público que irá apreciá-lo. “Para você ter cultura, você tem que ter várias manifestações, uma delas é o teatro. E você tendo uma escola de teatro, automaticamente você vai formar pessoas que se não forem para o palco trabalhar, pelo menos serão uma plateia informada, preparada para assistir”.

 

G1