Importância da negritude em Santos

Santos é uma cidade de vanguarda e preserva, nas suas ruas e avenidas, grande parte da história de desenvolvimento do Brasil. Muito graças ao seu Porto, que foi, por muitos anos, à época da colônia e do Império, a grande porta de entrada e saída de pessoas de diversos lugares do mundo, que passaram a viver nas terras tupiniquins. Muitos deles foram negros africanos, escravizados por muito tempo.

Mas foi aqui também que o movimento abolicionista ganhou forma e força, muito por conta da colcaboração de pessoas que lutavam em prol dos negros. São homens e mulheres que deixaram marcas na cultura e na história santista e que, nesta semana quando se celebra o Dia da Consciência Negra, e se cultua a memória de Zumbi dos Palmares, são lembrados com maior destaque. Foram negros e negras que se destacaram na política, no jornalismo, na cultura e no esporte, deixando a sua marca também na gastronomia, nas artes e na música.

A Cidade possuiu quilombos (área de refúgio dos escravos, africanos e afrodescendentes) representativos, como o do Pai Felipe, na Vila Mathias – onde está, atualmente a garagem da CET, e o do Jabaquara, que foi liderado por Quintino de Lacerda e chegou a receber mais de 10 mil negros.

Ubirajara Hilário Campos, popularmente conhecido como Bira, é o presidente do Conselho Municipal de Participação e Desenvolvimento da Cultura Negra. Milita na área desde 1965, quando, pelas mãos de Dráuzio da Cruz, foi para a Império do Samba. Ele afirma que hoje não há um local físico na cidade que represente a importância dos afrodescendentes no desenvolvimento do Município.

“Talvez a área onde estava o quilombo do Pai Felipe. No centro da Cidade, perto da Alfândega, havia um pelourinho, que era o sinal do poder do Império e hoje não há nem isso. Falta um ponto representativo”, afirma, destacando que há a ideia de se construir um memorial.

Uma das únicas manifestações culturais que ainda sobrevivem, segundo Bira, é o samba. “As escolas são símbolo da resistência do tempo. No esporte, temos a capoeira também, além de outros atletas de destaque, até recordistas sulamericanos”, destaca.

Do passado, o coordenador faz questão de destacar fatos importantes vinculados à negritude. “O Teatro Guarany foi um dos locais da resistência negra na Cidade, onde se entregavam as cartas de alforria.
Do quilombo do Pai Felipe, no Jabaquara, saiu o primeiro desfile organizado de Santos, comemorando a libertação dos escravos no dia 13 de maio” Também aponta Maria Patrícia, que era auxiliar de Silvério Fontes e realizava partos, e o jornalista Juarez Bahia como símbolos de lutas pela raça.

“Os negros não são considerados imigrantes, diferentementes de japoneses e italianos, porque eles foram sequestrados da África para o Brasil. Muita coisa ficou no meio do caminho. Não temos como cidade-irmã de Santos um município africano. Os clubes negros, como o Ébano, Quitandinha, que escolhiam as banquinhas do café, não existem mais”, lamenta Ubirajara.

Esporte
Ao falar da questão esportiva, não há como deixar de recordar dos negros que, vestidos com o manto branco santista, brilharam em todo o mundo. “Talvez sejamos a única cidade do planeta a ter três campeões mundiais: Pelé, Edu e Joel”, conta Bira. Além deles, Milton José Ribeiro, o Mono, José Pereira Filho, dentre alguns atletas.

A capoeira também tem papel de destaque. Cícero Tatu é um dos mestres mais conceituados na Baixada Santista. “O primórdio da capoeira em Santos aconteceu no Monte Serrat, quando os escravos se reunião para fazer o samba-duro (mais informações na página 7). Depois, houve o surgimento da capoeira organizada, por meio do Mestre Sombra. Ele a levou para o exterior, aliás”, enfatiza.

Política
Na questão política, os negros também tiveram destaque. Tatiane Evangelista, uma das responsáveis pela Coordenadoria de Promoção da Igualdade Racial e Étnica (Copire), órgão da Prefeitura de Santos, destaca dois personagens que fizeram história: Quintino de Lacerda, que foi o primeiro vereador negro de Santos e responsável por coordenar o quilombo do Jabaquara, e Esmeraldo Tarquínio, eleito prefeito em 1968 e cassado 48 horas antes de assumir o mandato.

“Foram as figuras mais emblemáticas, com certeza. Mas, além deles, há outros negros e negras que foram vereadores e ocuparam papeis de destaque na política santista”, ressalta ela. Dos atuais 17 edis, apenas um é descendente de negros.

Alzira Rufino, escritora e presidente da Casa de Cultura da Mulher Negra, é uma das autoridades mais respeitadas no País sobre o assunto. Ela também lembra que Santos foi um dos primeiros municípios do País a criar um conselho público voltado, especificamente, aos afrodescendentes. “Santos teve um trabalho destacado nesta área, muito por ter abrigados três quilombros”, diz.

Mas todos são unânimes ao afirmar que falta mais atuação dos negros na política. E que isso acaba sendo refletido na própria sociedade. “A participação em cargos eletivos até acontece, mas a maioria não assume que é negro. Eles também não abraçam a causa e a sociedade não os enxerga desta forma”, opina Tatiana.

“Santos é uma cidade pioneira em lutas e de vanguarda democrática, mas é elitista e conservadora. É algo que preocupa não ter mulheres ou negros no Legislativo, por exemplo. Não adianta falar somente no dia 20 de novembro e não se tocar mais no assunto”, completa.

Alriza Rufino reforça a tese. “O trabalho hoje é frágil porque não temos representantes. Acho que devemos ter um novo olhar para a questão racial e para a cultura negra”. Para ela, o trabalho de fortalecimento dos negros na política e na sociedade deve ser norteador por três ações: apoiar, fortalecer e respeitar”.

O presidente do Conselho, Bira, destaca que as minorias não estão representadas hoje na política santista. “Precisamos ter mais participação, com certeza. Espero que, nos próximos anos, a nossa questão seja discutida de forma mais profunda na Cidade”, defende.

 

Boqnews

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